A realidade era dura. E era por isso mesmo que ela sonhava. Por mais que a cada dia que se passasse ela se sentisse mais perdida, mais ela sentia, lá no fundo de seu ser, em segredo, que estava muito próximo dela ser achada. Acho que alguns chamam isso de esperança. Mas não era isso não! Ela sentia mesmo! Era o que seria. E porque ela sentia... Ela acreditava. E porque ela acreditava, era verdade!
É verdade! Ela era sonhadora. Gostava de sonhar tudo! Sonhava chocolates, sonhava sonhos (seus e dos outros), sonhava música, sonhava dança, sonhava pintura, sonhava até a realidade. Não pense que tem algo estranho nessa forma de escrever porque não tem! Mas deixe-me explicar. É que sonhar para ela era a mesma coisa que ‘degustar. ’ AH... Mas isso só ela sabia! As vezes ela se esquecia e acabava falando assim. “- sonhadora essa menina!” diziam sempre que a ouviam falando daquele jeito! Mas isso não importava... É. Não importava mesmo! Era tão bom ser daquele jeito sonhadora... Às vezes começava no vento. Aquela imagem de folhas pairando no ar desenhando formas diversas misturada com poeira, pó e luz... Tudo em volta ia silenciando de tão focada que ela ficava olhando para as folhas... E em um instante, antes que o vento fosse embora, ela já estava lá com o vento...mergulhando coma s folhas, se imaginando do tamanho de uma joaninha que voou junto com a folha e acabou adorando ‘surfar’ no ar... “-Menina! De que é que está rindo tanto?” e ela voltava para sua realidade. E o sorriso ia se desfazendo ao dar-se conta de que aquelas folhas estavam ali porque haviam caído de uma árvore que estava sendo derribada por aquela construtora que em breve levantaria mais um daqueles arranha-céus de deixar a gente tonta só de olhar pra cima e ter a sensação de que eles estão se movendo. “-nada não!” ela respondia. “-foi só um pensamento” completavam junto com ela a frase e riam e diziam que ela não tinha jeito!
Um dia ela decidiu. “- vou colecionar sonhos!” fazia mesmo um tempo que não colecionava nada. E “sonho” era realmente algo que ela gostava muito! Então ela começou pelos seus amigos. “-olha, será que você poderia me doar algum sonho seu que você não queira mais ou que esteja esquecido ou que não caiba mais em você?” “-se quiser em troca eu dou seu chocolate preferido!” e assim lá foi ela. Não é que ela fosse egoísta e quisesse todos os sonhos do mundo pra si. É que muitas vezes as pessoas jogavam seus sonhos fora e isso ela via como um grande desperdício! Tá. Tudo bem. Eu conto um segredo: No fundo, ela queria muitos sonhos porque não imaginava que existisse no mundo alguém melhor que ela para administrá-los. Veja bem. É tanta gente sem sonho ou gente que não sabe mais sonhar... Ela não podia simplesmente deixar sonhos irem para o lixo! Só que tinha um problema. Onde ela guardaria tantos sonhos? AH! Vocês não tem idéia de como foi bom ela saber que não sabia como guardaria. Por que? Porque foi pensando sobre todas as possibilidades que ela chegou em uma que ela acabou descobrindo que era a segunda coisa que ela mais gostava de fazer: Escrever. “-Claro, é isso!” e seus olhos brilharam como quando a gente está morrendo de sede e vê um copo cheinho de água! Escrevendo ela poderia dá forma aos sonhos! Assim ela não esqueceria nunca de nenhum! Depois ela poderia até abrir uma “sonhoteca” e vender os sonhos! Aí sim, ninguém ia poder reclamar de não saber sonhar ou ficar sem sonhos! E ela venderia bem baratinho para que todos pudessem comprar!
E não é que deu certo? A loja vivia cheia! Uns diziam: “-Nossa! A quanto tempo não tenho um sonho! Deve ser porque só chego cansado e não dá tempo ter.” Outros, mais idosos diziam: “-AH eu acho este sonho muito bonito! Quando era mais moço até quis ter um desses mas deixei passar e agora estou velho demais para isso.” Alguns de seus amigos falavam: “- Este aqui eu gosto muito! Mas acho que nunca conseguiria ter!” E todos esses “mas” deixavam a menina bastante triste! Só que ela não desanimava e acabava convencendo todos a levarem seus sonhos! A forma apaixonada como ela falava deles deixava todos motivados! Era impossível não querer um sonho com ela falando daquele jeito... Arregalando aqueles olhos grandes! Ela contava que a própria lojinha era um exemplo de como valia a pena ter sonhos, e ai eles acabavam pro ficarem sem argumentos!
Não pense que todos eram assim não! Havia umas pessoas que há muito tempo queriam um sonho, só não sabiam como sonhar ou qual sonho ter. Outros, que tinham sonhos demais e viviam confusos e por isso acabavam por compartilhar seus sonhos e sentiam-se bem melhor depois! E ainda tinha aqueles que se inspiravam nos sonhos da lojinha para melhorarem os seus. E tantos outros... Uns que só liam mesmo e pronto, outros que gostavam de ajudar a escolher os sonhos dos amigos... Enfim. Tinha de tudo! E assim ela foi vivendo. Com o tempo aqueles que adquiriram sonhos, sempre que passavam em frente à lojinha agradeciam a menina, ou ofereciam-lhe um sorriso, ou faziam-lhe pequenos cumprimentos. Estavam realmente satisfeitos com os seus sonhos. “ah! Que bom!” a menina pensava consigo mesma. E aquela sensação de “dever cumprido” realmente era muito boa! Ela se sentia útil sabe? Como se tivesse finalmente achado sua função no mundo! Como se ela definitivamente tivesse descoberto no que ela realmente era boa, no que sabia fazer. Melhor. No que ela amava fazer. [certos verbos mudam a vida da pessoa.]
Foi em um momento que lhe sobreveio essa sensação que ela viu que foi por sonhar que ela encontrou sua realidade. Foi aí que ela percebeu que alcançou o maior sonho de sua vida: devolver para a vida dos outros a possibilidade de sonhar.
É isso! É da possibilidade de sonhar que decorre o impulso para realizar. E é em realizar que está a possibilidade de sonhar novamente. Essa é a grande magia do sonho!
Thacilla Noronha.
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